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  • Débora de Mello

Não (suicidem) a adolescência! Considerações sobre Th1rteen R3asons Why


Thirteen Reasons Why é o primeiro romance escrito por Jay Asher em 2007, adaptado para série de TV por Brian Yorkey e lançado pela Netflix, em março de 2017. Nos Estados Unidos, o best-seller foi laureado por 13 diferentes instituições, além de ser leitura comum entre os adolescentes de 12 a 15 anos. Perguntei a alguns adolescentes americanos de 17 e 18 anos de idade o que acharam da série, toda minha amostragem respondeu que não havia assistido, por falta de interesse mesmo, e a maioria já havia lido o livro anos atrás. O romance é de fato para adolescentes, adultos ficam rapidamente entediados com a historia de Hanna Baker que deixa uma série de 7 cassetes onde ela relata situações provocadas por 13 pessoas diferentes que lhe causaram sofrimento e, segundo ela, foram corresponsáveis pela sua triste e infeliz decisão de cortar os pulsos e sangrar até a morte, afundada na banheira de sua casa. Trinta minutos antes de seu suicídio Hanna deixa a caixa com os cassetes na casa de um colega de classe, e de colega em colega, todos os envolvidos terão sua vez na roda da tortura.

Apesar do sucesso do livro, a série tem causado polêmica entre a crítica e os espectadores por abordar temas como suicídio, assédio e estupro entre adolescentes do Ensino Médio. Ler pode. Ver não. Pode parecer bizarro, mas é essa contradição que revela algo importante. Os adultos não podem nem ver e nem ouvir sobre a opressão e o desespero enfrentados por boa parte de seus filhos-estudantes; muito embora frequentem boas escolas, sejam bem vestidos, bem alimentados, e ainda por cima gozem das facilidades que a vida moderna oferece. Parece que nada que papai e mamãe, escolas fazem pode acalmar as feras. Nada irá apagar o período da adolescência. Nem mesmo a série delatora. Pelo contrário, negar aquilo que é próprio da adolescência pode tornar as consequências ainda mais graves. No romance e na vida, o suicídio.

Não é nenhum privilégio dos jovens do século XXI. Há mais de 400 anos atrás Shakespeare alertara: “Eu desejaria que não houvesse idade entre dez e vinte e três, ou que a juventude dormisse pelo período, pois não há nada no meio desse período a não ser pegar prostitutas, ofender anciões, roubar e brigar.”(Contos de Inverno, Ato III, cena III)

Adolescência é adolescência. E vigiá-los constantemente é condição si-ne-qua-non para redução dos danos que essa turbulenta fase da vida irá provocar. Se existe algo que pesa para os adolescentes atuais é o fato da sociedade tentar abafar o barulho natural do adolescente com catálogos de saúde mundial, o DSM-5 e CID 10, lamentavelmente os intoxicando com medicamentos e rótulos. Além de alardear como se fosse coisa de outro mundo aquilo que sempre foi assim.

Você, adolescente que bebe, se droga, se corta, você não é mau, nem doente. É só um adolescente, com a mesma erupção destrutiva dos garotos elisabetanos, porém, cuidado, os brinquedos são atômicos nos seus dias. O rompante irá passar, se os adultos ao seu redor, estiverem fortalecidos o bastante para lhe oferecerem tempo e coragem, ao permitirem sua adolescência à olhos nus, vigiá-lo e suportá-lo dia após dia. É isso mesmo. Papai, mamãe, titias, avós, professores irão pegar no seu pé sim. E você vai urrar, xingar, bater porta entre outras coisas. E tudo bem, é assim que tem ser. Quando a fase passar, você poderá agradecer seus pais: Obrigado/a por não morrerem quando eu tentei matá-los.

Em 13 reasons why exceto pela mãe de Clay Jensen, a litigante, que considera o filho sempre como culpado, sentenciando penas a cada atitude estranha do filho, exigindo que a porta do quarto fique aberta, oferecendo caronas que mais servem para espionar, questionando sobre a influencia dos melhores amigos sobre seu filho, exagerando até o ponto da comédia e, do pai a calá-la; os demais pais estão estranhamente enfeitiçados. Lidam com suas bombas humanas dentro de casa, como se estivessem lidando com gatinhos e gatinhas. Sweet Heart, Angel, é como a mãe de Hanna Baker a chamava, nem sequer desconfiando das forças apocalípticas com que sua filha vinha lutando ainda com pele psíquica frágil como a de um bebê, de acordo com o poema que escreveu. Quando a filha corta o cabelo, tentando uma mudança na vida, o pai lhe diz que o novo corte o fez lembrar de quando ela era pequenina, o efeito é contrário, não de avançar, mas de aprisionar esse adulto em incubação na imagem da menininha. De novo, sem desconfiança alguma que a adolescência demanda. Adolescentes podem ser de vez em quando Sweet Hearts, mas não na maior parte do tempo. Quando o pai de Courtney Crimsen recebe intimação para o depoimento da filha, ele não se abala, segue dizendo que provavelmente seria coisa de rotina, e recomenda a filha que diga a verdade e tudo acabará bem. De fato, esse é o melhor conselho que ele poderia lhe dar, contudo, não fazia a menor ideia do que estava falando, para ele a filha adolescente não fazia adolescência. E não é preciso comentar as longas ausências dos pais de Jessica Davis e Alex. E quanto a Bryce, era órfão?

De todos os encrencados, complexados, esquisitos e apropriados adolescentes de Liberty High School somente Hanna era de fato boazinha e não sobreviveu. Lamentavelmente a única coisa exageradamente adolescente, destrutiva, que encontrou para fazer foi planejar tirar a própria vida e envenenar temporariamente a vida de todos a sua volta. Adolescente não? Antes tivesse Hanna perdido mais malotes de dinheiro da loja dos pais, teriam tido oportunidades para argumentos e honestidade aguçando os laços de confiança-desconfiança com a vida e com o ser humano, começando com ela mesma. Asher presta um excelente serviço a humanidade lembrando que o adolescente é também um sofredor. Mais um motivo para portas do quarto fechadas, e banhos longos com tempo limitado. Mais um motivo para pais e mães Sherlocks arrumarem a bagunça de seus filhos de vez em quando. Quem tem um adolescente, em casa ou no trabalho, por favor, traga a adolescência para debaixo de seu nariz.

Th1rteen R3asons Why é para adolescentes, eles se identificam, encontram ecos e conexões. A literatura, as séries de TV, o cinema, o teatro tem o interessante poder de causar transformações no psiquismo de quem faz uso dessas artes. É aprender pela vida de outros. Personagens ganham livre arbítrio, são bem-vindos e permitidos a adentrar na vida do adolescente pela porta da frente. Assim, interagem, mexem e remexem a intimidade desse híbrido criança-adulto em diversas gradações, dos 10 aos 25 anos. Th1rteen R3asons Why não é para adultos roubarem o destempero que é dos adolescentes, invadirem a adolescência como se algo estragado precisasse de conserto. Fazerem do adolescente um idiota que vai se suicidar porque leu num livro, assistiu um filme ou uma série. Quem assim pensa faz bem revisitar urgente os conceitos de arte e prestar atenção em seu adolescente, mas não os irritem desnecessariamente.


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